sábado, 10 de abril de 2010

Lembrando de nossas aulas I

Crítica/ "A Morte de Freud - O Legado de Seus Últimos Dias"

Ensaio jornalístico traz comentário banal sobre o fim da vida do autor
MARCELO COELHO
COLUNISTA DA FOLHA

"Eu, prof. Freud, afirmo que, após a anexação da Áustria pelo Reich alemão, tenho sido tratado pelas autoridades alemãs e, particularmente, pela Gestapo com todo o respeito e consideração devidos à minha reputação científica; que eu poderia viver e trabalhar em plena liberdade (...) e que não tenho a mínima razão para fazer qualquer reclamação."
Este é o teor do documento que Sigmund Freud, aos 81 anos, foi obrigado a assinar para que pudesse refugiar-se, junto com a família, na Inglaterra. O criador da psicanálise contou com a ajuda de amigos importantes, como a princesa Marie Bonaparte, e com o interesse do presidente americano Franklin Roosevelt, para enfim sair de uma Viena entregue à ferocidade antissemita.
Não havia alternativa. Freud subscreveu o texto que lhe fora imposto, mas acrescentou de próprio punho um adendo irônico: "Posso recomendar a Gestapo a qualquer pessoa".
Histórias desse tipo não são raras em "A Morte de Freud - O Legado de Seus Últimos Dias", pequeno ensaio jornalístico de Mark Edmundson que conta em detalhes o período que vai de 14 de março de 1938, quando Adolf Hitler é recebido triunfalmente em Viena, a 23 de setembro de 1939, quando Sigmund Freud morre depois de receber, a seu pedido, as injeções de morfina que encerrariam os sofrimentos causados pelo câncer.
No exílio londrino, Freud é visitado por personalidades como Virginia Woolf e Salvador Dalí, enquanto escreve o capítulo final de "Moisés e o Monoteísmo".
Colaborador de revistas como "The New Republic" e "Harper's", Mark Edmundson tem boas histórias a contar sobre esses encontros, assim como sobre o amor que Freud dedicava à sua cadela de estimação. Acompanhamos também a sorte de alguns dos personagens de seu círculo familiar (as irmãs de Freud permaneceram em Viena; três delas morreram nos campos de extermínio).

Banalidades
Dirigido a um público leigo, "A Morte de Freud - O Legado de Seus Últimos Dias" não pretende trazer informações inéditas ou interpretações originais. Mesmo levando em conta essa ambição modesta, deve-se dizer que Edmundson abusa dos seus direitos à banalidade.
No fim da vida, diz o autor, Freud "se manteve firme e corajoso; teve até mesmo a equanimidade de produzir novas pérolas de sabedoria, de tempos em tempos". Referindo-se ao médico de Freud, o autor escreve: "Deve ter sido difícil para Schur acreditar que diante dele estava talvez o mais poderoso e influente intelectual de seu século".
Para quem não se incomoda com frases como essas, nem se cansou de ver citada, como se fosse novidade, aquela de Marx sobre "tudo que é sólido se desmancha no ar", o livro de Mark Edmundson pode ser uma boa indicação.


A MORTE DE FREUD - O LEGADO DE SEUS ÚLTIMOS DIAS

Autor: Mark Edmundson
Tradução: Luciano Trigo
Editora: Odisseia
Quanto: R$ 29, 90(232 págs.)
Avaliação: regular

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